Rating da Dívida Pública Portuguesa
A Moody’s baixou estes dias o rating da dívida pública Portuguesa 4 níveis, para Ba2 – a que toda a genta está a chamar simplesmente lixo.
Os bloggers e os politicos portugueses, de uma forma geral, estão muito indignados com a Moody’s. Mas a verdade é que eu não consigo perceber porquê.
Deixem-me explicar… Há duas perspectivas que permitem facilmente perceber esta quebra do rating, e uma perspectiva pela qual o rating é mais indicativo do que outra coisa qualquer.
A perspectiva económica – percorram a baixa lisboeta e perguntem aos comerciantes quando é que eles conseguiam ganhar dinheiro. E vão dizer-vos certamente que era nas prendas de natal que ganhavam dinheiros. A grande maioria dos pequenos comerciantes em Portugal vivem para o dia a dia, e apenas nos dias especiais conseguem desafogar um bocadinho o seu negócio. Este ano o subsidio de Natal vai ser metade do que é normalmente, o que significa que a grande maioria dos portugueses vai ter muito menos dinheiro para gastar com prendas e com todo o festejo. E isso vai significar que muitos comerciantes, que muitas pequenas empresas vão entrar no novo ano em condições financeiras menos do que optimas. E possivelmente, no próximo ano, a crise grega vai chegar a Portugal… muitas pequenas empresas vão fechar, muitas pessoas que trabalhavam nessas empresas vão acabar no desemprego, e a economia vai continuar nessa espiral, com menos consumo, mais empresas a fechar, mais pessoas no desemprego.
A menos que alguma coisa realmente eficaz seja feita para contrariar esta tendência.
A perspectiva politica – não há dúvida hoje que o novo governo Português pretende ir mais longe do que o acordo firmado com a Troika, que – tanto quanto consigo perceber – não incluia, por exemplo, nenhuma directiva acerca de tributar em 50% os subsidios de Natal. Isto pode ser visto como uma tentativa de atingir os resultados pretendidos mais depressa, e de forma mais eficiente. Mas a verdade é que o programa de governo não apresenta algumas das medidas simples que poderiam fomentar o empreendedorismo, ajudar a reduzir a borucracia – como simplificar o sistema fiscal ou reduzir os custos relacionados com o estado das pequenas empresas (registo, contabilidade, etc). E não é completamente claro se estas medidas especiais eram medidas que o novo primeiro ministro já tinha planeado e decidiu não discutir durante a campanha eleitoral ou se decidiu implementá-las depois de estar no governo, e são uma consequência do real estado das finanças do estado – talvez porque as contas apresentadas estão decoradas para ficarem mais atraentes.
Mas, independentemente de estas medidas terem sido planeadas antes das eleições ou serem consequência de contabilidades duvidas encontradas em alguma gaveta escondida do ministério das finanças, a verdade é que vão contra tudo o que o novo primeiro ministro prometeu ao povo Português durante as eleições, e isso é exactamente o que fez o seu predecessor.
Esperemos que este apertar de cinto especial seja de facto especial, e não o primeiro de uma série de pequenos e sucessivos apertos de cinto.
Isso sim, ia colocar o rating da dívida portuguesa pelas ruas da amargura.
O Verdadeiro Problema
Mas o problema não está no rating da dívida pública Portuguesa. O problema está na própria dívida e na forma como tantos economistas de renome e governantes olham para a dívida como se ela fosse a solução para todos os problemas económicos que qualquer país possa enfrentar.
Eu percebo que quando existe uma crise, se o estado poder gastar dinheiro, isso pode ajudar a minorar a crise. O problema não é os governos investirem para tirar a sociedade da crise. O problema é fazerem-no atirando dinheiro para mega-projectos com retorno de médio e longo prazo, ou sem retorno de todo, e especialmente fazerem-no principalmente adjudicando esses projectos às mesmas mega-empresas que acomulam os projectos em alturas de crescimento económico e que não distribuem a riquesa que o estado assim lhe dá.
Mas, mais do que isso, a forma como se gerem os periodos de crescimento económico é ainda uma parte mais significativa do problema. É que se o estado quer ter dinheiro para gastar quando a crise chega é bom que o poupe quando não precisa de revitaizar a economia. E se não poupou na fase anterior à crise, é preciso que o peça emprestado, mas que o pague assim que lhe é permitido reduzir o financiamento.
Hoje vê-se o estado como um homem rico que mantém os seus trabalhadores (no caso são todos os que vivem no pais) contentes dando-lhes dinheiro, comida, roupa e todas as mordimias, mas todos sabemos que não foi assim que os ricos ficaram ricos, e também sabemos que não o seriam por muito tempo se assim fizessem.
E de nada serve dizer que o homem rico pagou para construir umas cercas a separar o campo de trigo do de milho, os feijões das ervilhas. Para que o homem rico continue rico é preciso que mande regar o milho, o feijão e as ervilhas, não construir cercas que de nada servem – a não ser tornar o trabalho produtivo mais difícil – ou ricos caminhos que não levam a lado nenhum ou apenas servem para ir ao mesmo sitio onde já levam outros caminhos.
E é por isso que o rating da dívida portuguesa é, acima de tudo, indicativo. É indicativo do caminho que é, mais do que necessário, urgente seguir. O caminho da redução radical da dívida. O caminho da produtividade, o caminho da retirar custo e díficuldades ondes eles e elas não são necessários. O caminho de reduzir as despesas que não levam a lado nenhum (quantas auto-estradas temos mesmo que ligam Lisboa e o Porto?), e fazer algumas despesas que façam algum sentido, que permitam a criação de mais empresas, que tornem mais fácil às pequenas empresas prosperar e criar mais emprego, ajudar as empresas que querem inovar a inovar, as que querem exportar a exportar, a que querem investir a fazê-lo de forma produtiva.
Mas, acima de tudo é preciso perceber que o que se pede emprestado tem que ser, eventualmente, pago, e que bom pagador paga mais cedo, não mais tarde. Mas paga de vez, não com dinheiro que pediu emprestado ao vizinho do outro lado. Há que começar rapidamente a reduzir a dívida, e não a fazê-la crescer ligeiramente abaixo do crescimento esperado do PIB.