O Fim das Presidenciais

Vasco Campilho escreveu hoje um post intitulado Por um mandato presidencial de sete anos não-renovável, em que defende a alteração da Constituição da República Portuguesa para que o Presidente da República seja eleito por sete anos, não podendo ser reeleito.

Eu, concordando com parte dos pontos, e principalmente com o ponto principal do Vasco, que é a de que as Eleições em que um Presidente da República concorre são uma perda de tempo, pois em 35 anos de democracia não houve uma única vez em que o candidato em funções não fosse reeleito, discordo da base do problema.

O problema não é que ninguém tenha interesse nas eleições intermédias. O problema não é sequer que toda a gente ache que o candidato em funções vai ser reeleito, e consequentemente ninguém se interesse. O grande problema é que o país não precisa de um Presidente da República. O que o país precisa é do poder executivo e o poder legislativo mais separados, e os poucos poderes que hoje pertencem ao Presidente da República sejam redistribuidos.

Vejamos (Art. 133º e seguintes da Constituição):

  • Presidir ao Conselho de Estado – O conselho de estado é um orgão consultivo da presidência, logo deixa de ser necessário, e consequentemente não precisa de presidente.
  • Marcar as Eleições – do que eu percebo da coisa, não deve ser assim tão díficil. Com toda a certeza que uma pequena comissão parlamentar presidida pelo Presidênte daAssembleia pode tratar disso. Já para não sugerir delegar essa capacidade na Comissão Nacional de Eleições.
  • Convocar extraordináriamente a Assembleia da República – Isto significa mesmo o quê? Convocar a Assembleia a meio da noite ou a meio do verão? Para que é que serve o Presidente da Assembleia?
  • Dirigir mensagens às Assembleias (da República e das Regiões Autónomas) – estilo o quê? aquela cena dos Açores? O discurso da aprovação da lei do casamento gay (contrariado, mas aprovo)?
  • Dissolver a Assembleia – A chamada bomba atómica. Porque razão é que se há-de poder dissolver a assembleia – e ainda para mais fazer deste poder um poder discricionário do Presidente? Este poder deve ser exercido pelo povo sobre a forma de abaixo-assinado significativo, seguido de referendo.
  • Nomear o Primeiro-ministro – toda a gente sabe quem é que vai ser nomeado. Mas ainda assim é preciso ser o Presidente a nomeá-lo. Porque não a Assembleia, mais uma vez? Em vez de aprovarem o programa de governo, porque não elegerem-no e deixarem-no governar?
  • Demitir o Governo – Mais uma vez, a bomba atómica. Porquê? Para criar questões politicas complexas como a que foi criada com o Governo do Santana, primeiro nomeado, e depois demitido. Tê-lo-ia a Assembleia eleito, ou seriam necessárias novas eleições? Não deveria um governo ter um número dois que assumisse o papel em situações como as do Barroso? A demissão do governo, a ser exercida por alguém deve sê-lo pelo povo sob a forma de abaixo-assinado posteriormente referendado.
  • Nomear e Exonerar os membros do governo – Ahh, o Zézinho é muito meu amigo, diz-lhe para ser meu ministro. Ahhh, zanguei-me com o zézinho, diz-lhe para ir para o quarto dele! O Primeiro-Ministro não é capaz de gerir sózinho a própria equipa e, quanto muito, apresentá-la à aprovação da Assembleia?
  • Presidir ao conselho de ministros quando o Primeiro-Ministro lho solicitar – como assim, o Presidente da República é uma espécie de representante do Primeiro-Ministro? Uma espécie de Primeiro-Ministro de Segunda?
  • Dissolver as Assembleias das Regiões Autónomas – Mais material nuclear. Mas para quê mesmo?
  • Nomear representantes da República para as Regiões Autónomas – Porque não o Primeiro-Ministro ou o Presidente da Assembleia da República?
  • Nomear e Exonerar o presidente do Tribunal de Contas e o Procurador Geral da República – Presidente da Assembleia da República ou a própria Assembleia – se a Assembleia não chegar a acordo em tempo útil chicoteiam-se os lideres de todos os partidos com assento parlamentar.
  • Nomear membros do conselho de estado – desnecessário, uma vez que este é um orgão consultivo do presidente.
  • Nomear dois vogais do Conselho Superior de Magisteratura – Mais uma bela competência para a Assembleia.
  • Presidir ao Conselho Superior de Defesa Nacional – Isto parece-me mesmo a cara do Ministro da Defesa em Representação do Primeiro-Ministro.
  • Nomear e Exonerar sob proposta do Governo os Chefes Militares – Para mim não faz sentido que seja o governo a propor os nomes dos Chefes-de-Estado-Maior, especialmente quando o Presidente é que é o Chefe Supremo das Forças Armadas. Passa tudo para o Primeiro-Ministro, com aprovação da Assembleia.
  • Comandante Supremo das Forças Armadas – Ministro da Defesa em representação do Primeiro-Ministro.
  • Promulgar e mandar publicar leis – acaba-se com a promulgação e um funcionário administrativo do gabinete do primeiro-ministro e outro na assembleia da república tratam disso.
  • Submeter a referendo questões de relevante interesse nacional – entrega-se este poder ao Supremo Tribunal de Justiça, que o deverá activar para qualquer lei ou decreto sobre entrega de um número razoável de assinaturas – 2000 ?
  • Declarar o estado de sítio ou estado de emergência – Ministro da Administração Interna?
  • Prenunciar-se sobre todas as emergências graves para a vida da República – Esperaria que este fosse um direito de todos os cidadão, e que os lideres dos principais partidos o fizessem de forma adequada – não é normalmente verdade. Também não se pode esperar muito da comunicação social. Mas deixamos esta função a cargo do Primeiro-Ministro, dos Ministros que tutelam a emergência em causa, e dos lideres da oposição.
  • Indultar e comutar penas – Supremo Tribunal.
  • Requerer o parecer do Tribunal Constitucional – Assembleia da República, Governo e cidadãos.
  • Requerer declaração de inconstitucionalidade do Tribunal Constitucional – Assembleia, Governo, Cidadãos, e o próprio tribunal deveria ser pró-activo nesta matéria.
  • Conferir condecorações – Depois do Sampaio, o Cavaco vai condecorar o resto dos Portugueses de classe média alta ou superior, pelo que esta função pode ser dispensada. Ou entrega-se a um subsecretário de estado (fica o SubSecretário de Estado das Medalhas).
  • Nomear Embaixadores e Enviados Extra-ordinários – Ministério dos Negócios Estrangeiros?
  • Ratificar Tratados Internacionais – Leis são leis, a Assembleia aprovova, publicam-se, e se um número suficiente de pessoas discordar referenda-se.
  • Declarar Guerra – O Ministério da Defesa é responsável por proteger o território. Em caso de agressão o Primeiro-Ministro declara guerra, depois de autorizado pela Assembleia.
  • Promulgação e Veto – A promulgação passa a ser automática, podendo a Assembleia discutir e vetar decretos do governo não autorizados ou pedir parecer sobre a sua constitucionalidade. Define-se um prazo após publicação para apresentação de um pedido de referendo junto do Supremo Tribunal de Justiça sob a forma de abaixo-assinado. O pedido de parecer ao Tribunal Constitucional deverá poder ser feito por qualquer partido devidamente constituido ou por grupos de cidadãos.

Claro que hoje a eleição do Primeiro-Ministro (não é uma eleição, mas uma nomeação efectuada pelo Presidente da República – que se espera irá nomear o lider do partido com mais votos nas Eleições legislativas – e essa nomeação é depois aprovada pela Assembleia da República) é também a eleição dos Deputados à Assembleia da República. Idealmente o Primeiro-Ministro seria eleito directamente, preferencialmente com um programa de governo e uma parte significativa da sua equipa.

Sim, eu acho que Portugal se deveria aproximar ao mesmo tempo das democracias presidencialistas e das democracias directas.

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