Factura Compulsiva Assinada

Restaurantes, cafés, tabacarias, táxis e vários outros “pequenos” negócios são descaradamente praticantes do negócio paralelo, seja por não registarem uma parte significativa das transacções em que participam, seja registando essas transacções e apagando-as ou alterando-as mais tarde, entregando às finanças uma versão menos abunatória dessa facturação.

Entre nós basta andar atento (e nem sequer é necessário andar muito atento) para perceber que a grande maioria dos restaurantes, café, tabacarias, táxis e muitos outros tipos de comercios de consumo imediato entregam aos seus clientes talões que muitas vezes não estão numerados, que por vezes estão númerados, têm todos os dados que devem ter, mas têm também impresso *** Não serve de factura***, são apenas consultas de mesa, ou simplesmente não é entregue qualquer documento.

E de nada serve tentar fazer muitos destes cavalheiros que uma consulta de mesa é um papel para levar à mesa do cliente antes de ele pagar, não se destina a entregar ao cliente quando ele paga.

Eu tenho por vezes a sensação que sofro de excesso de honestidade, pois não me passaria pela cabeça cobrar dinheiro a um cliente e não lhe entregar uma factura e um recibo, ou substitui-los por um papel a dizer que os produtos ou serviços fornecidos têm um determinado preço, mas que não fazem qualquer indicação sobre o facto de o cliente ter adquirido os items em questão e que já os tinha pago. Mas é isso que a maioria dos restaurantes me faz de cada vez que almoço ou janto fora.

Mais do que isso, já vi mais do que uma vez em linhas de self (restaurantes onde as pessoas pegam em tabuleiros e esperam em fila para serem servidas e pagar antes de começarem, de facto, a comer – não me perguntem porque têm este nome) a pessoa que está na caixa, tipicamente o patrão ou alguém da sua confiança, registar o pedido, receber o dinheiro, dar o troco, e em seguida anular a conta, sem sequer esperar que o cliente se afaste. Irrita-me que o façam, choca-me que o façam descaradamente com o cliente encostado à caixa. E ainda mais quando o fazem antes ainda de darem o troco ao cliente, e quando o cliente sou eu e peço a factura (ou o talão, um dos dois têm quase sempre que me dar) registarem tudo novamente para poderem emitir a factura.

E, claro, já não vou referir que a maioria (provavelmente são todos) dos programas de facturação para este tipo de espaços permite alterar à posteriori os talões emitidos – utilizando software que oficialmente não existe, e que é guardado em maquinas alternativas. Assim, a única coisa que estes senhores têm que fazer é ir guardando os talões, em vez de os entregarem aos clientes, e no final do dia alterar esses talões para terem um valor menor do que o que originalmente foi facturado.

Mas, perguntam-me, como impedimos que isto aconteça?

Para acabar com este fenomeno é necessário implementar duas medidas, que são relativamente simples de criar e que têm um custo que facilmente poderá ser suportado por todas as empresas.

Factura compulsiva

À primeira dessas medidas chamarei factura compulsiva. Trata-se de alterar a lei para que passe a ser obrigatório entregar a factura ao cliente para qualquer montante. A maioria destas empresas já tem um software de facturação ou uma maquina registadora com capacidade para emitir talões com um custo por talão práticamente despresável, pelo que isto não representa um custo adicional significativo para as empresas. Sim, a grande maioria dos talões irá para o lixo, muitas vezes vão mesmo ficar dentro da loja (ou café ou restaurantes…), mas isso não é um problema quando introduzirmos a segunda medida.

Mas acima de tudo, esta medida destina-se a minorar a quantidade de transações não facturadas. Poderiamos argumentar de que há fugas ao fisco com valores muito mais significativos, mas a verdade é que ignorar estes crimes de menor dimensão apenas porque existem outros de maior dimensão significa permiti-los todos, quando o que realmente precisamos é de os tornar estigmáticos, de os tornar socialmente inaceitáveis.

Assinatura digital

Mas se obrigar a emissão de facturas irá reduzir o número de facturas não emitidas, isso não resolve o problema das facturas alteradas e das facturas são anuladas porque os clientes para quem foram emitidas as deixaram no estabelecimento.

Mas existe, com a tecnologia que temos actualmente, uma forma simples de ultrapassar este problema. Essa solução passa pela transformação do cartão de contribuinte num cartão inteligente, à semelhança do novo cartão de cidadão. Este cartão seria o responsável por manter o registo do número da última factura emitida, o total das facturas emitidas utilizando esse cartão e por assinar cada uma das facturas.

A assinatura funcionaria como uma assinatura do tipo chave-pública, chave-privada. O cartão teria a chave privada protegida, que nunca seria lida a não ser pelo processador incorporado no próprio cartão, que receberia os dados relativos a cada factura, como o número, uma lista das linhas da factura, num formato a definir. O processo de assinatura passa por criar um documento padrão com o dados fornecidos, e criar uma assinatura para esse documento. A assinatura é devolvida e deverá ser impressa no documento. O número do documento é guardado, e nenhum documento com número menor do que esse será assinado na série desse documento. E o total do documento será adicionado ao total da série.

Em qualquer altura será possível obter os totais de todos os documentos assinados por cada série. E isto, juntamente com uma listagem dos documentos emitidos, já actualmente emitida por qualquer programa de facturação legalmente aceite (o formato SAFT-PT pode ser utilizado para este fim) permite fácilmente validar que todos os documentos emitidos foram declarados.

E, acredito (tenho esperança será mais adequado?) eu, a fuga aos imposto passa a ser uma questão bem mais díficil de implementar e, consequênte, passa a ser um crime ainda mais grave, e designável de “fraude fiscal”, sempre, ou quase.


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