Tributar o lucro

Hoje tributamos os particulares pelos seus rendimentos, e as empresas pelo seu lucro. E tributamos empresas e particulares de forma desigual. Tributamos o lucro das empresas numa pequena percentagem e o lucro dos particulares de forma progressiva, tributando menos quem ganha menos, e vamos tributando progressivamente mais aqueles que têm mais rendimentos.

Trata-se de um modelo típico da grande maioria dos paises ocidentais. Não é possível tributar mais a base da pirâmide que menos rendimentos têm, pois esses já têm grandes dificuldades em ter uma vida digna, quando o conseguem, e por isso tributa-se a classe média, as pessoas que têm rendimentos mais elevados, mas deixam-se os lucros da empresas de fora, com a justificação de que graças a esses lucros as empresas conseguem fazer mais e melhores investimentos, e criar, com isso, mais e melhores postos de trabalho e melhores condições para o crescimento económico.

Sendo esta a justificação simples de um modelo económico capitalista, a verdade é que o capitalismo tornou-se no inevitável monstro em que se justifica a acomulação de riqueza com a própria riqueza, e em que se subvaloriza o trabalho e o esforço para manter margens de lucro e rentabilidade que apenas servem para continuar a colocar a riqueza onde ela se encontra originalmente.

Mas, mais do que isso, devido ao poder que o capital traz, criam-se leis que permitem aumentar a capacidade do capital de se valorizar, desvalorizando o trabalho da grande maioria da sociedade.

Devemos, então, acabar com o dinheiro, e voltar a trocar produtos e serviços? Não, claro que não. Isso não é uma solução para uma sociedade tecnológica como a nossa. Numa sociedade ideal teriamos um modelo de gratuitidade dos bens essenciais, e cada um de nós faria aquilo que melhor sabe fazer apenas pela sua própria realização, e então o capital seria completamente desnecessário. Mas esse tempo ainda não chegou, e o dinheiro é uma excelente forma de colocar o valor onde o valor se encontra.

O problema hoje não está na existência do dinheiro, mas na acomulação da riqueza. E o que a sociedade realmente precisa é de uma distribuição mais equilibrada da riqueza criada, de tributar de forma igual o lucro criado por qualquer entidade, qualquer que ela seja.

A forma mais simples de resolver esta questão é criando uma lista de incrementos patrimoniais que são dedutiveis,e tributando de forma igual qualquer incremento que não faça parte dessa lista. Todos os serviços e produtos de consumo imediato são, obviamente, dedutiveis, pois vão ao encontro do objectivo base, que é a redistribuição da riqueza gerada.

Há alguns bens, maioritariamente de valor significativo, que a maioria das familias, por necessidade ou tradição, tem. Mas nestes casos, como acontece hoje com as empresas, esses bens poderão ser deduzidos de forma progressiva. Isto é ainda mais adequado se considerarmos que a grande maioria destes bens são hoje adquiridos com recurso a crédito pago ao longo dos anos.

O valor dedútivel pode ser limitado no tempo (isto é, uma casa, por exemplo, pode ser amortizada ao longo de 20 anos ou mais) ou estabelecer-se um valor máximo por pessoa que habita nessa casa (0,5 ordenados minimos por mês, por pessoa?). Por exemplo, se o agregado familiar é constituido por 5 pessoas, essa familia poderá amortizar 2,5 ordenados mínimos por mês.

Outros bem de menor valor, como electrodomésticos, poderão também ser aceites como dedutiveis.

Outros, como obras de arte, poderão ser dedutiveis desde que sejam obras únicas ou séries limitadas, compradas directamente ao seu autor ou a representante directo, durante a sua vida. A aquisição de obras de autores falecidos será, obviamente, desconsiderada para efeitos de isenção, assim como reproduções de uma forma geral.

Ao contrário dos bens, que apenas em alguns casos, e dentro de certos limites seriam consideráveis como custos, os serviços seriam sempre considerados. A principal razão porque os serviços seriam sempre considerados é porque, por um lado cumprem o nosso propósito inicial de redistribuir a riquesa, e por outro, porque esses serviços se transformam automáticamente em rendimentos de uma outra entidade, e que posteriormente poderemos tributar, se disso for o caso.

A questão que ainda se coloca é a da tributação de produtos transferidos. Como o que pretendemos não é tributar o comercio, mas a acomulação de riqueza, o custo de quaisquer artigos vendidos poderá ser deduzido até ao menor de dois valores, o preço de custo e o preço de venda. Esta regra poderá ser aplicada de forma generalizada a todos os contribuintes. No caso dos bens cuja amortização seja permitida, o valor já amortizado deve ser reduzido à dedução permitida.

Há muitas outras questões que se podem levantar a partir de esta ideia. Acham que ela poderia funcionar? Há alguma dúvida que este post vos deixa e que gostariam de ver aprofundada? Alguma coisa que gostariam de acrescentar? Comentem, perguntem, deixem as vossas opiniões, as vossas ideias, as vossas questões.

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